domingo, maio 13, 2007

Há a bela e há a fera

O homem que eu fito
adormece bruto.
Anoitece impiedoso
derramando sobre mim
seus rios de líqüidos vorazes,
com sua cara de mau
e um jeito de violação.
Como são eternas as noites
em que eu não tenho direito a respiração!
Violenta-me como patrão
castigando a negrinha que sou.

O homem que me fita
acorda macio.
Amanhece cristão
derramando sobre mim
seus rios de água benta,
como sua cara cheia de sol
pedindo perdão.
Como são eternos os dias
em que tudo é religião!
Afaga-me como mãe
protegendo de qualquer absurdo a criança que sou.

À noite, este homem indaga minha carne.
Pergunta-lhe que mulher eu sou;
se eu oferto corpo aos amantes,
se eu me embriago, se eu me dou.
De dia, este homem indaga minha alma.
Também pergunta-lhe que mulher eu sou;
se eu oferto flores aos amantes,
se eu choro, se eu morro de dor.

Profano e sagrado é o meu amor:
este homem timidamente feroz.
Sorrindo, comendo, cuspindo, sofrendo...
Um estupro como uma canção.
Seqüestra-me e depois resgata-me.
E, nos filmes, me faz torcer para que empate
a batalha entre o príncipe e o dragão.

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