quinta-feira, maio 17, 2007

Adolescer

Eu quero sair desta cápsula sorridente.
Embora sorridente, é cápsula,
e cápsula sempre aprisiona sorrindo
- é uma forma de enjaular meninas para o nunca vôo.
Deus do céu, quero ser livre!
Quero odiar o Deus do céu com tanta barriga fumegante,
que não caberia em mim.
Quero desacreditar nesse Deus,
cansei de ser a menina cristã carregando a culpa
de sugar os olhos dos machos irriquietos
(irriquietação malvada)
e corromper os homens de bem.

Eu quero sair desta cápsula sorridente
aonde eu me deito em corpos quentes
e destruo minha face pouco a pouco.
Quero o grito rouco,
quero o uivo louco dos bêbados do centro da cidade.
Quero perder as grades, soltar os fios,
amar o vício, e não odiá-lo tremendo.
Cuspir na cara do bandido e me apaixonar pelo inimigo,
sem medo de maltratar as formigas;
quero pisá-las, todas, elas.
Quero provar do inferno,
deixar apodrecer o pão nosso de cada dia.

Eu quero sair desta cápsula sorridente.
Que embora sorridente, é cápsula traiçoeira,
que não vê a hora de afundar-me em poço fundo
- de onde eu nunca mais conseguirei sair!
Deus do céu, quero ser livre!
Virar-me em passarinho
sem ninho, sem casa, até sem asa.
Ser menina sem boneca, sem roupa, sem nada.
Correndo atrás de não sei o quê.
Indo em direção ao não sei onde.
Quero apenas ser mulher,
mulher cheia de útero: isso basta.

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