domingo, agosto 16, 2009

O Roedor

Você, solto dentro de mim,
feito um bicho.
Você me roendo a cor dos olhos,
sim, e também os mamilos
- o leite azedo que jorra dos mamilos.

Você me roendo a música clássica
que o coração executa.

Você roendo os ruídos da minha festa,
a fogueira na qual me ardo,
a lama nos meus sapatos,
o meu beijo de morte.

Roendo também a minha sorte.

Você me roendo o cetim da roupa,
os dias sangrentos, as noites úmidas,
a triste espera por um milagre,
o pão, a poesia, os homens, o Deus.

A sua língua roendo a minha linguagem,

os dentes afiados do meu cão,
minha sombra, meu pecado, minha redenção,
você roendo você - que também é parte minha.

Feito um bicho que rói
e também ilumina,
você vai me roendo
e vai me iluminando:

tornando cheio o vazio que fica
- dando à minha miséria
a grandeza de se saber miserável.