domingo, maio 11, 2008

Duo

Paradoxalmete, vou-me construindo, como se eu carregasse em mim peso e leveza, um pouco de patrão e de negrinho. Parte de mim anoitece sóbria, outra parte tem febre e delira - acredito que a vida seja assim mesmo para quem, como eu, mergulha em tudo o que há de natureza humana. Sou sempre duplamente: mulher das cavernas abraçando luzes, senhora das enchentes de vazio, lambendo docemente os rios - sou mulher de lamber as coisas. Um tanto reprimida, outra tanto perdulária. Em meu útero: filhos ardentes; em minha alma: rocha, pedra calcária. E assim, vou-me mostrando, co'a boca orgulhosa pintada de risos e com uma tristeza amarga no olhar: em meu rosto, desenha-se um córrego com duas vertentes: uma boa, outra mar. Tudo me faz sofrer e gozar: a existência, quando não me é rebento, me arrebentar.

3 comentários:

Vanessa de Moraes disse...

Esse seu texto me fez lembrar Sartre por demais. Essa premissa de que o homem se constrói ao longo da vida e que não somos nada além daquilo que escolhemos ser.Sartre diz que estamos condenados à liberadade e que , assim sendo, devemos ter cuidados com nossas escolhas pois elas afetam os outros de todo.Já dizia Da Vinci: "Onde há muito sentimento , há muita dor". O sentir é sempre um doer e a vida se contrói dessa forma, um chorar e sorrir sôfrego, mas além de tudo, um projeto que vale a pena ser empreendido.

Marina Moura disse...

Uma boa outra mar, que não é má.
teu escândalo contido é lindo lindo.

:*

Biagio Pecorelli (be.) disse...

pretinha... estamos eu e Samir aqui lendo teus textos pela madrugada...

desse, tirariamos somente, somente, uma palavra humana. Deixariamos só a natureza.

lindo, linda.

beijo